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Arriscar vale a pena

Momento Lifetime
Por Lifetime Brasil el 23 de July de 2022 a las 00:30 HS
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Em março, eu publiquei nesta coluna um texto antigo sobre voltar ao jogo do flerte e dos relacionamentos na condição de mãe solteira. Passa o relacionamento, ficam os filhos e a necessidade de se adaptar a uma realidade completamente diferente daquela que havia antes. Naquele texto, eu expressava a minha frustração com muitos homens na casa dos vinte e poucos que enxergam mães solteiras como oportunistas, ou como uma ameaça, ou como um fardo de responsabilidade para eles — como se a condição de mãe se sobrepusesse a de ser mulher e nós estivéssemos sempre à procura de um pai para nossos filhos e um marido para formar família, quando na verdade, muitas vezes o que a gente quer é apenas estar na companhia de alguém do sexo oposto, como qualquer pessoa solteira. Ironicamente, às vezes é o homem que pode significar algum fardo para a mulher solteira que é mãe, já que muitas de nós não quer ter que passar por todo o desgaste emocional que é dividir de novo a vida com alguém, apresentar para os filhos e envolvê-los com outro cara que não o pai. Poderia ser simples: duas pessoas se encontram, se gostam e tentam se conhecer melhor, deixando claras suas intenções. Se daí vai surgir um relacionamento ou não, é uma perspectiva a longo prazo e a mera possibilidade não deveria impedir ninguém de passar um ou outro momento junto.

 

[ASSISTA A VIDA SEXUAL DE UMA MÃE SOLTEIRA, QUARTA (08), ÀS 22H00]

 

Desde a redação daquele texto para cá, eu envelheci e, consequentemente, meus potenciais parceiros também (o que não é uma regra, mas isso é assunto para outro momento). Entre os vinte e poucos e os trinta e poucos, casamentos foram feitos e desfeitos, filhos nasceram, mentalidades mudaram. A maior diferença que eu percebo é que aos trinta, a maturidade traz mais clareza e mais calma no tocante das relações — já tivemos nossas ilusões desfeitas e investir em um compromisso se torna uma questão mais séria, que deve ser feita com cuidado. Há gatos tão escaldados que preferem tomar o caminho de volta, se fechando e se tornando tão indisponíveis e exigentes que evitam qualquer possibilidade real de poder alimentar de novo sentimentos e relações românticas, já antecipando o prejuízo que pode (ou não) vir no futuro. Embora essa perspectiva pessimista deva ser levada seriamente em consideração, eu penso que não se permitir amar e ser amada/o leva a uma existência monótona e triste. Evitando sofrer, evita-se também a possibilidade de ser feliz, em uma imobilidade indefinida que apesar de segura, não cresce, não floresce, não gera frutos e nem se renova. É quase uma negação da vida, preferindo se tornar um ser inanimado que uma hora se tornará esquecido. 

 

Como escrevi acima, acontece que nem sempre o que uma pessoa solteira quer é se envolver, e isso não significa ficar com o primeiro que aparecer. A maior dificuldade nessa fase da vida é encontrar pessoas descomprometidas que sejam suficientemente interessantes: o que mais tem são machistas equivocados que pensam que mães solteiras são mulheres que saem com qualquer um, ou caçadores de pessoas aparentemente vulneráveis que buscam como alvos mulheres que podem estar fragilizadas por serem mães (ou que são mais velhas, ou fora dos padrões de beleza etc.), portanto, presas fáceis para narcisistas e ególatras. Ainda que o terreno seja pantanoso, não deixa de ser incrível que nos dias de hoje seja possível encontrar pessoas através de sites de relacionamento e aplicativos como o Tinder. Para quem é descomplicado as possibilidades são vastas, e o simples ato de curtir o perfil de alguém e descobrir que ele ou ela também gostou de você, já ajuda na manutenção da autoestima. Eu vivo entrando e saindo do Tinder: quando estou entediada, baixo o aplicativo para que pessoas estão por lá, e as mensagens que recebo costumam ser respeitosas e até divertidas. Inclusive um rapaz chegou a me perguntar apareciam mesmo muitos tarados e afins e eu posso dizer que, no meu caso, não: quando a primeira mensagem de um cara já me parece estranha, eu faço logo a descombinação. O máximo de inconveniência pela qual já passei foi receber um "Dá-lhe Bolsonaro" ou "Eu sou de direita, e agora?". Eu ri, mas não respondi.

 

Na verdade, foi através do Tinder que reencontrei uma pessoa com quem tenho uma história marcante e que não via há quase dez anos, apesar de estarmos conectados pelo Facebook. Ou melhor, ele me encontrou, justamente em um momento em que eu estava lidando com uma rejeição. E a partir daí, tivemos a oportunidade de nos vermos, de conversarmos e esclarecermos muitas das coisas que haviam ficado suspensas. Aquele encontro com o passado acabou sendo muito benéfico para mim: foi peça fundamental no processo de resgate de identidade pelo qual eu já vinha passando, me fazendo lembrar de quem eu era e de quem ainda poderia ser, me mostrando que minha pior inimiga estava sendo eu mesma. Ele reatou seu relacionamento alguns meses depois, mas deixou em mim a certeza de que arriscar ainda vale a pena.

 

IMAGEM: Distribuido por Reel One Entertainment © Thrill Films 2 Inc. e NB Thrilling Films 4 Inc.

 


Arriscar vale a pena - 1 Renata Arruda é jornalista de cultura e especialista em mídias socais. Mantém
um blog sobre livros no Huffington Post Brasil e assina o Prosa Espontânea.


TWITTER: @renata_arruda
INSTAGRAM: prosaespontanea